Assunto é debatido por Grupo de Trabalho, do SENAI Nacional, integrado por pesquisadores/as e especialistas do SENAI nos estados do Rio Grande do Norte, Ceará, São Paulo, Paraná e Santa Catarina
Especialistas do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI) discutem, em Natal, soluções para impulsionar a formação profissional no Brasil voltada à “Economia Verde”. O objetivo é definir materiais, softwares e outros investimentos para a criação de protótipos que ajudem a potencializar o ensino prático nas aulas, aproximando estudantes de todo o país da realidade das indústrias.
A discussão na capital teve início quarta-feira (23) e segue até esta sexta (25), no Hub de Inovação e Tecnologia (HIT) do SENAI-RN. O assunto é debatido pelo Grupo de Trabalho para a Economia Verde, do SENAI Nacional, integrado por pesquisadores/as e especialistas de diferentes áreas do SENAI nos estados do Rio Grande do Norte, Ceará, São Paulo, Paraná e Santa Catarina.
“O que a gente pode trazer de tecnologia para mostrar aos alunos que não estamos falando de nenhum bicho de sete cabeças? O que podemos trazer sobre descarbonização (o processo de diminuir — e, no futuro, zerar — a liberação de gases que causam o aquecimento do planeta)? O que podemos propor, do básico ao mais complexo…?” – estão entre as reflexões que lançam sobre a mesa. “E aí nós vamos trabalhar a materialização disso, olhando o cenário atual e o futuro”, diz o especialista em Desenvolvimento Industrial no Departamento Nacional do SENAI e coordenador do Grupo de Trabalho, Frankwaine Melo.
Demanda
O objetivo, explica Melo, é desenvolver soluções didáticas para dar suporte à educação na formação de competências técnicas para a economia verde. “Nós estamos nos antecipando à demanda da indústria e pensando a economia verde como ‘um mundo’, que não é só energia solar, energia eólica ou hidrogênio verde”, frisa ele.
A expectativa é ter, ainda este ano, os protótipos desenvolvidos para, em 2026, começar a implementá-los nas escolas do SENAI. “Agora nós vamos definir o que é preciso, descrever especificações técnicas, dizer a potenciais fornecedores ‘a gente tem essa ideia, no que você pode ajudar?’ e validar essas tecnologias em projetos-piloto para que possam ganhar escala na rede”, complementa o coordenador do Grupo de Trabalho.
Segundo o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (UNEP, na sigla em inglês), a economia verde é aquela que promove o bem-estar humano e a equidade social, ao mesmo tempo em que reduz os riscos ambientais e a escassez de recursos naturais. Na prática, é um modelo de baixo carbono — que emite menos gases de efeito estufa —, com uso mais eficiente dos recursos e ênfase na inclusão social.
De acordo com a Confederação Nacional da Indústria (CNI), instituição que engloba o SENAI, a transição para esse modelo deve ser sustentada por quatro pilares principais: a transição energética para fontes limpas, a regulamentação do mercado de carbono, o estímulo à economia circular e a conservação das florestas.
Frankwaine Melo, coordenador do Grupo de Trabalho: “Nós estamos nos antecipando à demanda da indústria e pensando a economia verde como ‘um mundo’, que não é só energia solar, energia eólica ou hidrogênio verde”
Ideia é expandir possibilidades de ensino prático para além de energia e hidrogênio verde
Em discussões preliminares, especialistas que integram o Grupo de Trabalho levantaram ideias como “kits didáticos” que possibilitem simular a produção de “amônia verde” ou o “sequestro de carbono”, como forma de expandir possibilidades para as aulas do SENAI realizadas em laboratório. Complementos e melhorias em ferramentas de ensino que já existem também estão em estudo.
“Hoje temos kits didáticos que possibilitam simular a geração de energia solar, a energia eólica, a produção e a aplicação do hidrogênio verde. Temos carros em miniatura e células a combustível que permitem uma aplicação prática, para o/a aluno/a entender como funciona um carro elétrico, por exemplo. Agora, a ideia é expandir isso. É ir além do hidrogênio verde, pensando também na formação de produtos”, diz Fabiola Correia, pesquisadora do Instituto SENAI de Inovação em Energias Renováveis (ISI-ER) e integrante do Grupo de Trabalho.
O investimento em softwares para a simulação de processos químicos está entre os caminhos em discussão. Um deles envolve a produção de amônia verde, produzida a partir de fontes de energia renovável – como alternativa ao uso de combustíveis fósseis – para potencial uso em diferentes setores da economia. “A produção de amônia verde, ou seja, amônia produzida a partir de hidrogênio verde, para gerar um produto com baixa pegada de carbono, é uma grande demanda da indústria”, frisa Fabiola.
A discussão ocorre em um contexto em que a indústria de fertilizantes, que tem a amônia como base para a produção de produtos nitrogenados, é vista como de difícil descarbonização e depende de amônia importada para o processo produtivo. Tradicionalmente, a composição desses produtos envolve uma combinação de nitrogênio da atmosfera com hidrogênio (H2), oriundo de combustíveis fósseis.
“Tem se falado muito em produzir amônia com hidrogênio verde – que utiliza energias renováveis – e sobre a possibilidade de transportar hidrogênio por meio da amônia verde, inclusive para exportação. A exportação na forma de produto – e não de gás – fica mais fácil”, acrescenta a pesquisadora do ISI-ER.
O investimento em softwares para a simulação de processos químicos está entre os caminhos em discussão, diz a pesquisadora do ISI-ER e integrante do Grupo de Trabalho, Fabiola Correia
As análises realizadas pelo Grupo de Trabalho se concentram no que é preciso “ter a mais”. “E isso envolve a infraestrutura atual e para a possível formatação de novos cursos”, acrescenta Fabiola, ressaltando que “a indústria verde já existe e precisa de mão de obra”.
Esta é a primeira reunião presencial do Grupo. Outras rodadas de discussão já haviam sido realizadas online. “Para ver o que o mercado mundial tem em termos de conjuntos didáticos de formação, se esses conjuntos contemplam as competências que nós desejamos, se há algum gap entre o que tem no mundo e o que tem nas nossas necessidades”, diz Frankwaine Melo.
A programação incluiu visita aos laboratórios de energia eólica, energia solar, hidrogênio e combustíveis avançados do ISI-ER, assim como ao primeiro “Centro de Excelência em Formação Profissional para Hidrogênio Verde” do Brasil, instalado no Centro de Tecnologias do Gás e Energias Renováveis (CTGAS-ER), do SENAI-RN.
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Esse trabalho com foco na Economia Verde está sendo realizado pensando no portfólio de cursos que o SENAI já tem nessa área ou é pensando na criação de novos cursos?
Em ambas as situações. Esse é um grupo de especialistas que está olhando para o presente e o futuro. Então, olhando para kits, conjuntos didáticos que tenham soluções no mercado, ou aquelas que a gente vê que são necessárias e o nosso trabalho é desenvolver essas soluções, as especificações de como seria o conjunto didático para auxiliar a formação. O centro da discussão é a infraestrutura.
E quando a gente fala de infraestrutura, a gente está falando de softwares, de livros, do que, exatamente?
A gente está falando de hardware, principalmente de hardware. E software, que normalmente embarca, mas principalmente hardware.
Como o quê, por exemplo?
O kit didático é a gente ter, por exemplo, uma planta didática que vai auxiliar na produção de hidrogênio, através de uma reação química X ou Y, ou um reator, que a gente hoje só tem de grande porte, mas que a gente tem necessidade de ter menor. Para que ele possa ficar em cima de uma bancada, dentro de um laboratório. A gente fala de uma formação em manutenção de sistemas eólicos, por exemplo. Então, a gente pode ter um aerogerador, pode ter um kit didático de aerogeradores, que a gente já conhece, que tem no mercado, mas digamos que nenhuma dessas soluções consiga atender uma necessidade específica, uma competência específica, uma capacidade específica que a gente identificou, mas que o mercado não conseguiu desenvolver ou ainda não enxergou a necessidade de ter. O nosso papel é identificar e desenvolver, fazer especificações para desenvolver, utilizando, possivelmente, parceiros externos também, para apoiar essa parte de desenvolvimento, para a gente ter esses conjuntos didáticos no futuro nas escolas do SENAI.
Vocês pretendem chegar a uma definição sobre esses materiais já a partir dessa reunião, em Natal?
Sim, a gente fez algumas reuniões online que trazem um cenário de descoberta. Então, nesses três dias aqui, a gente está discutindo mais sobre, olhando para aquilo que a gente viu, o que a gente vai propor, então a gente vai trabalhar em cima de um, dois, três, 10 conjuntos didáticos, por exemplo, e trazer uma proposta de especificação daquilo que pode ser viável para ser produzido. Daí, a gente vai contar com parceiros, fornecedores, que vão transformar essas ideias em um objeto físico. Daí, vamos testar, validar, rodar, e, aí sim, ter uma solução final.
Então, vocês definem aqui o que o SENAI quer e aí vão para esse próximo passo, que é o mercado, como materializar isso, como viabilizar.
Exato.
E vocês esperam que esse processo todo esteja incluído quando para que isso chegue na sala de aula, nos laboratórios?
A nossa expectativa é que, ainda esse ano, a gente tenha uma solução pronta para dizer para as escolas do SENAI que esse conjunto didático tem capacidade para desenvolver tais competências, rodar tais cursos. Esperamos ter, este ano, os protótipos desenvolvidos para, no ano que vem, isso estar sendo implementado nas escolas.
Por que o SENAI sentiu necessidade de ter essa discussão agora? A instituição já tem grande experiência e infraestrutura para formação na área de energias renováveis, agora de hidrogênio, então por que essa ideia de expandir, de trazer coisas novas nesse tema?
O SENAI, e aqui eu falo do Departamento Nacional e de todos os Departamentos Regionais, está sempre à frente no contexto tecnológico e industrial. Faz parte da nossa missão essa transferência de tecnologia para a indústria e preparar uma mão de obra qualificada para o profissional atual e do futuro. Então, a gente teve há pouco tempo um projeto que iniciou com parceria da GIZ e outros parceiros – aqui no Rio Grande do Norte tem laboratórios que foram implementados como frutos disso – e ainda assim, a gente vê que muitos estudos, muitos trabalhos estão sendo feitos no Brasil e no mundo, e que não dá para parar no que a gente tem, porque a gente precisa estar sempre um passo à frente. Então, é um trabalho contínuo. Não é ‘chegamos aqui e encerramos’. A gente tem feito isso para a indústria 4.0 e agora estamos fazendo para a economia verde. Eu diria que estamos com o livro com as páginas em branco e que vamos ver o que vai ser escrito ao final desse projeto.
Texto e fotos: Renata Moura
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